Preferência repentina por comidas mais condimentadas; vontade em querer colocar mais sal ou mais açúcar nas refeições; dificuldade em identificar odores ou sabores; alteração do gosto dos alimentos consumidos. Todos esses são sintomas clássicos de quem está com ‘perda olfativa’. Ou seja, de quem tem diminuída a capacidade de sentir cheiro, o que interfere diretamente no nosso paladar e também pode ensejar outros riscos à saúde.
De acordo com o otorrinolaringologista Gilberto Ulson Pizarro, do Hospital Paulista – referência em saúde de ouvido, nariz e garganta – esse tipo de disfunção é mais comum após os 60 anos e dificilmente os pacientes têm essa percepção. Por isso é valido, algumas vezes, ficarmos atentos aos hábitos de nossos familiares à mesa.
“Se você nota, por exemplo, que a comida já está suficientemente salgada, mas, mesmo assim, seu pai, mãe ou outro acompanhante tendem a colocar mais sal, isso já pode ser uma evidência. A perda de olfato afeta o sabor da comida, que depende da textura do alimento, do gosto amargo, doce, salgado e para refinar o cheiro do alimento. Para compensar essa deficiência, as pessoas costumam aumentar a dose nos temperos, no sal e no açúcar – o que já é algo preocupante e um indicativo da perda olfativa”, explica o médico.
Diferentes causas
A perda do olfato, também conhecida como anosmia, é a incapacidade total ou parcial de detectar odores. Isso pode ocorrer devido a várias razões, como infecções respiratórias, alergias, sinusite, trauma craniano, exposição a certas substâncias químicas, envelhecimento e condições médicas como a Covid-19. A perda do olfato pode afetar significativamente a qualidade de vida, pois os odores desempenham um papel importante na percepção do ambiente e no sabor dos alimentos.
O médico explica que essa disfunção pode ser algo temporário ou mesmo definitivo, a depender da origem do problema. Mas, de toda forma, é sempre importante investigar. “As causas da perda olfativa podem ser das mais variadas. Ela pode decorrer de uma simples obstrução nasal por rinite ou desvio de septo, pode ser um indicativo de diabetes, consequência de um processo natural de envelhecimento ou, até mesmo, da existência de um tumor. Por isso, a avaliação médica é essencial”, alerta.
Riscos
Além da questão relacionada à boa alimentação (que requer um consumo moderado de sal, açúcar e condimentos), o Dr. Gilberto Ulson Pizarro lembra que a perda de olfato pode ensejar riscos de acidentes graves, justamente por comprometer um sentido vital para o ser humano.
“Organicamente, o cheiro tem a função de nos proteger contra a ingestão de alimentos estragados, assim como de situações de perigo, como fogo, fumaça, ou mesmo intoxicações, como ocorre com produtos químicos, a exemplo do cloro, do gás de cozinha etc. Tudo isso pode representar sérios riscos à vida”.
O médico relata o caso de uma paciente que teve uma explosão dentro de casa, justamente por não sentir o cheiro de gás de cozinha que havia no ambiente. “A neta dela havia aberto o dispositivo da mangueira, mas ela não sentiu o cheiro e, ao ligar a luz da cozinha, houve uma grande explosão”.
Outro problema muito frequente, segundo o médico, é o descuido da higiene pessoal, por não sentir cheiro de suor, urina e fezes. “Isso é mais comum entre os idosos e o principal risco em com relação a possíveis infecções. Portanto é algo que também precisa ser sempre observado, especialmente após os 60 anos”, destaca.
Diagnóstico e tratamento
Quanto ao diagnóstico, o Dr. Pizarro explica que, hoje em dia, a tecnologia permite uma rápida identificação das eventuais causas que originam a perda olfativa. “No ambulatório de olfato do Hospital Paulista, nós conseguimos, já por meio de um teste inicial, identificar se é a causa condutiva (isto é, relacionada a alguma obstrução do nariz), neurossensorial (quando há comprometimento de células específicas ou nervos que levam a informação de cheiro para o cérebro) ou se é mista (ou seja, decorrente dos dois problemas).
Quanto aos tratamentos, o especialista esclarece que eles variam conforme o diagnóstico. “Um tratamento muito comum e que também serve como método preventivo é o chamado ‘treinamento olfatório’, que consiste na utilização de óleos essenciais ou produtos com cheiros bem característicos para treinar o sentido do paciente”.
Sequelas pós-covid
De acordo com o Sistema Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS), no início da pandemia de COVID-19 era notória a alta frequência de perda de olfato (anosmia) e do paladar (ageusia) nos pacientes que adquiriam essa doença. Tanto que a sua presença era considerada importante para a suspeita diagnóstica de Covid, já que não são manifestações clínicas comuns de outras doenças infecciosas agudas com quadro respiratório.
Embora reversíveis na maior parte das pessoas que os apresentavam, esses sintomas podiam ter duração prolongada em alguns, e mesmo não desaparecer, pelo menos de forma completa, em outros. Ao longo de mais de três anos e meio de pandemia, notou-se que esses sintomas foram se tornando menos frequentes, e hoje em dia quase não se ouve mais falar a respeito deles.
Em um artigo publicado na USP em 2022, o médico otorrinolaringologista Fábio Pinna, afirmou que “Antes da covid-19 esse problema era ignorado. Os tratamentos eram pouco conhecidos, se acreditava que não havia muito o que fazer. Hoje há evidências de que é importante tratar para minimizar tanto a perda de qualidade de vida causada pela disfunção sensorial em si como para prevenir outros problemas de saúde associados. Temos um incentivo para não desistir do tratamento”, diz.
Legislação – SUS
De acordo com a Agência Câmara de Notícias, existe um Projeto de Lei 2127/22 em tramitação, de autoria do deputado Otto Alencar Filho, que determina a integração das ações do Sistema Único de Saúde (SUS) no diagnóstico, tratamento e reabilitação das alterações decorrentes da perda total do olfato (anosmia) ou parcial (hiposmia).
Até o encerramento da matéria, não conseguimos obter mais informações do deputado para esclarecer detalhes adicionais sobre este projeto.