O uso de preenchimentos estéticos com PMMA, polimetilmetacrilato, poderá ser banido no Brasil. A medida está em análise pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), após recomendação do Conselho Federal de Medicina (CFM), feita na última terça-feira.
Na avaliação da CFM, o produto, que vem causando lesões e até morte de pacientes em procedimentos invasivos, deve ser proibido. Para o CFM, o país vive um grave problema de saúde pública com o uso indiscriminado do PMMA para fins estéticos, inclusive por não médicos.
Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, usar o produto na forma injetável pode causar complicações como infecções, reações inflamatórias, necroses, insuficiência renal aguda e crônica, podendo causar mortes. No final do ano passado a Anvisa destacou que o PMMA não é indicado em procedimentos com fins estéticos, sendo aprovado para fins corretivos.
O documento do CFM é focado na apresentação do PMMA como substância injetável para preenchimento, sem análise de suas aplicações como cimento ósseo, lente intraocular ou outros usos em medicina e odontologia. O texto ressalta que a decisão foi tomada após diversas tentativas de alerta e regulamentação feitas por sociedades médicas de especialidade, como da Sociedade Brasileira de Dermatologia e a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, pelo CFM e pela Anvisa ao longo de mais de 18 anos.
“As tentativas têm se mostrado infrutíferas, sendo incapazes de restringir o uso de produtos à base de PMMA a pequenas quantidades e com fins reparadores. O uso em grandes volumes e com fins estéticos vem aumentando vertiginosamente, inclusive por profissionais não médicos, causando imenso dano à população”, observa o documento.
Os conselheiros do CFM constataram que uma série de normas do uso do PMMA são infringidas: o registro na Anvisa só permite que médicos realizem procedimentos com a substância – o que não acontece – e a bula do produto não traz indicação para aplicação de grandes quantidades e no glúteo, por exemplo, como também tem acontecido com frequência. Em 2013, um parecer do CFM já recomendava que a substância fosse utilizada apenas por médicos, em pequenas doses e com restrições, “pois em grandes volumes seu uso é inseguro e imprevisível, podendo causar reações incuráveis e definitivas”.
Complicações
“O uso do PMMA pode causar edemas locais, processos inflamatórios, telangiectasias, cicatrizes hipertróficas, reações alérgicas e formação de granuloma. Estas reações podem ser imediatas, mediatas ou tardias”, listou o documento do CFM à época. Para o CFM, existem alternativas mais seguras, como a aplicação de ácido hialurônico, disponível em diversas apresentações e que promove aumento de volume com menor risco de reações adversas tardias.
“A medicina evolui e produtos mais seguros vêm para substituir produtos antigos. Ao longo do tempo, ficou demonstrado que os riscos suplantam seus benefícios. As complicações do PMMA são tardias, relacionadas a características do produto, e ocorrem mesmo quando aplicados por médicos especialistas”, afirma o presidente do CFM. O requerimento que será entregue à Anvisa ressalta que “é perceptível, pela análise das publicações científicas, que o Brasil é um dos únicos, senão o único país, onde o PMMA ainda é usado com finalidade estética, especialmente em grandes volumes para preenchimento da região glútea”.
No entendimento do CFM, o tratamento da reação inflamatória do produto é extremamente complexo, pois ele fica entremeado aos tecidos saudáveis, tornando sua remoção cirúrgica um procedimento complicado e com sequelas irreversíveis. “Seu uso em grandes volumes ainda está relacionado ao desenvolvimento de hipercalcemia e lesões renais, podendo evoluir para insuficiência renal em casos graves”, lembra o documento.
Apesar da incidência da formação de granulomas possa ser considerada baixa na literatura médica (1,9% conforme a revisão sistemática publicada em 2019), esse número é contrastante com os dados obtidos nos levantamentos conduzidos pela SBCP, evidenciando a existência de subdiagnóstico e subnotificação do problema.
Em 2020, uma influenciadora digital perdeu parte da boca e do queixo após fazer preenchimento labial com PMMA. No ano passado, outra influenciadora morreu após se submeter a um procedimento estético para aumentar os glúteos. Recentemente, a modelo Aline Maria Ferreira morreu dias depois de aplicar o PMMA nos glúteos em uma clínica em Goiânia. No Recife, Adriana Barros Lima, de 46 anos, também usou o produto e morreu.
HIV/Aids
No documento, o CFM reconhece a importância do tratamento da lipodistrofia relacionada ao HIV/Aids, condição que é parte fundamental para a inclusão e o bem-estar desses pacientes. Porém, o tratamento padrão-ouro utilizado em todo o mundo consiste no uso de substâncias de preenchimento mais modernas e com melhor perfil de segurança, tais como o ácido polilático, a hidroxiapatita de cálcio e a lipoenxertia autóloga.
“O uso do PMMA como preenchedor em paciente com HIV/Aids vem sendo abandonado em favor de produtos mais seguros e, atualmente, tem seu uso restrito a poucos centros de referência no Brasil, vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A manutenção da comercialização do PMMA como substância de preenchimento para atender somente esse grupo populacional não se justifica”, diz o requerimento.
Polimetilmetacrilato
O polimetilmetacrilato é um componente plástico usado tanto na saúde quanto em setores produtivos, dependendo da forma de processamento da matéria-prima. Ele pode ser encontrado, por exemplo, em lentes de contato, implantes de esôfago e cimento ortopédico.
No campo estético, o PMMA é autorizado pela Anvisa somente para tratamento reparador em casos de correção facial e corporal, provocadas por sequelas de doenças como a paralisia infantil e para correção de lipodistrofia, que leva à concentração de gordura em algumas partes do corpo, provocada pelo uso de medicamentos antirretrovirais em pacientes com HIV/aids.
A aplicação do PMMA, segundo a Anvisa, deve ser feita por profissional médico ou odontólogo habilitado. Mas o Conselho Federal de Medicina revela que, dos mais de três mil e quinhentos cursos de estética cadastrados no Ministério da Educação, 98% não exigem formação em medicina. E que 81% das vagas nos cursos de estética são vinculadas ao ensino à distância.
A associação que representa os fabricantes do PMMA declarou que, em vez de proibir o produto, é preciso combater o mercado clandestino. A Anvisa afirmou que vai analisar toda a documentação entregue pelo Conselho Federal de Medicina. E reiterou que o PMMA não é indicado para fins estéticos.
Estética com Segurança – Confira AQUI as orientações da Anvisa