Bebês que chegam ao mundo antes da hora podem enfrentar desafios que vão além do baixo peso e da imaturidade pulmonar. Entre essas condições estão as cardiopatias congênitas, malformações no coração presentes desde o nascimento.
De acordo com o Ministério da Saúde, entre seis e oito a cada mil nascidos vivos apresentam algum tipo de cardiopatia. Considerando todos os partos, estima-se que um em cada 100 bebês tenha algum defeito cardíaco. Esses números reforçam, portanto, a importância do diagnóstico precoce e do cuidado especializado desde os primeiros dias de vida.
A cardiologista pediátrica Keylla Passos, coordenadora do Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital Mater Dei Salvador, explica que algumas dessas alterações são especialmente frequentes em prematuros. “As doenças cardíacas congênitas mais comuns nesses bebês são o canal arterial patente, a comunicação interventricular e a comunicação interatrial“, afirma.

O que são as cardiopatias mais frequentes em prematuros
O canal arterial patente (PCA) é uma estrutura presente em todos os fetos e que, normalmente, se fecha nas primeiras horas após o nascimento. Em prematuros, entretanto, esse fechamento pode demorar ou até não ocorrer espontaneamente, o que gera sobrecarga no coração e nos pulmões.
Já as comunicações interventricular (CIV) e interatrial (CIA) são orifícios entre câmaras do coração que podem se fechar naturalmente, sobretudo quando são pequenas. A oclusão espontânea ocorre, portanto, com mais frequência em defeitos menores.
A CIA e a CIV provocam mistura inadequada de sangue entre as cavidades cardíacas, podendo causar cansaço, dificuldade para ganhar peso e maior risco de infecções respiratórias. Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria, essas alterações estão entre as causas mais comuns de internação cardíaca em prematuros e, quando não tratadas, podem evoluir para insuficiência cardíaca ou impactar o desenvolvimento.

Diagnóstico e tratamento: identificação precoce faz diferença
O diagnóstico das comunicações interventriculares pode ocorrer ainda na gestação. No entanto, isso nem sempre é simples.
“Quando o defeito é muito pequeno, abaixo de três milímetros, o ecocardiograma fetal pode não identificar, dependendo muito da posição do bebê e das limitações naturais do exame. Nesses casos, o diagnóstico costuma ser feito após o nascimento e, felizmente, não traz risco imediato à vida do recém-nascido“, explica Keylla.
No caso do PCA e da comunicação interatrial, o diagnóstico é sempre pós-natal. “Essas estruturas existem e permanecem abertas durante toda a vida intrauterina. O esperado é que se fechem naturalmente, mas nos prematuros isso nem sempre acontece“, completa a cardiologista.
Nem toda cardiopatia congênita exige intervenção imediata, já que muitas se fecham espontaneamente. Quando o fechamento não ocorre, o tratamento varia conforme a gravidade. O canal arterial patente pode ser corrigido com medicamentos, cateterismo ou cirurgia. “A decisão é sempre individualizada, baseada na evolução clínica de cada bebê”, afirma a cirurgiã cardiovascular pediátrica Nadja Kraychet, do Hospital Mater Dei Salvador.
As comunicações interatrial e interventricular seguem a mesma lógica: defeitos pequenos e sem repercussão são acompanhados clinicamente; já os maiores exigem fechamento por cateterismo ou cirurgia.
Riscos ao longo da vida e importância do acompanhamento
Além das alterações estruturais no coração, estudos da Organização Mundial da Saúde indicam que pessoas que nasceram prematuras têm maior probabilidade de desenvolver doenças cardiovasculares na vida adulta. O risco aumentado inclui hipertensão, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica.
“Os maiores riscos para a saúde cardiovascular desses bebês, ao longo da vida, são a hipertensão arterial crônica e as doenças metabólicas. Por isso, eles precisam de um olhar diferenciado do pediatra desde cedo“, reforça Keylla.
Por isso, especialistas recomendam acompanhamento regular com cardiopediatra e pediatra, especialmente nos primeiros anos de vida. Segundo Nadja, “quando há avaliação precoce e personalização do tratamento, é possível evitar complicações e oferecer a esses bebês a chance de uma vida normal, com crescimento adequado e sem limitações“.
